— Adeus, garota — murmurou Hugar para mulher ao vê-la afastando-se o mais rápido possível com a rainha.
O brutamontes viu aquela dúzia ou mais de homens aproximando-se velozmente, como uma grande linha de frente pronta para massacrar centenas de inimigos, mas não sentiu medo, ele era e seria sua própria linha de frente. Pensou em sua família, sua esposa e seus filhos, rezou algo de poucos segundos para os deuses antigos e deixou o sangue esquentar, o corpo ser dominado por adrenalina.
— Ainda existe um nortenho respirando nesse castelo, seus filhos da puta! Venham, suas malditas cadelas sulistas, vou mostrá-los o que um guerreiro do norte pode fazer! — berrou furioso iniciando uma corrida em direção aos homens que já estavam bem perto. Rugiu como uma verdadeira besta até chegar neles, um grito rouco e poderoso, que cessou quando impactou-se na fileira de inimigos, derrubando vários e iniciando uma sequência de golpes de machado, que cravavam-se em peitos ou cabeças e decepavam braços ou pernas, inundando-o em sangue.
E lutou ali até o momento que caiu no chão e
permaneceu ali, como o brasão de sua família dizia.
Alayne e Talia chegaram ao terceiro andar e puderam respirar o ar livre, estavam em céu aberto e no topo do castelo. Viram rapidamente o que acontecia lá embaixo e não conseguiram identificar muito bem quem estava ganhando, mas rezavam para que fossem eles, pois se estivessem logo uma horda de seus próprios aliados entraria pelas portas daquele castelo e os ajudariam, então apenas restava que aquilo acontecesse e que conseguissem sobreviver até aquele momento.
Ali em cima estava uma confusão também, mas num nível que chegava ser ridículo comparado com os andares de baixo. Eram tantas poucas batalhas ali em cima que passaram facilmente por elas, indo em direção à uma das torres, a da direita, pois a da esquerda parecia estar uma verdadeira confusão. Naquela da direita, havia apenas dois inimigos que Alayne matou rapidamente ao deixar Talia de lado por um pouco, com a ajuda de quatro soldados aliados que mataram rapidamente seus oponentes ao vê-las chegando. A nortenha virou-se num susto para a rainha quando a escutou gritar novamente, chamando toda atenção daquele andar, pegou-a rapidamente e foram para dentro da torre. Antes de entrar, viu um grupo surgindo da entrada oposta que tinham chegado, mais distante da torre da direita, mas que não mudou nada, pois logo que a viram correram para direção dela e da torre. E junto deles, veio a horda.
A torre era redonda e tinha três andares, com uma escada que levava para o segundo e terceiro rodeando-a por dentro. O terceiro era onde havia as ameias. No primeiro andar havia um tapete no chão coberto de sangue, três cadáveres, uma mesa pequena e duas cadeiras. No segundo andar estava vazio exceto outro tapete no chão e algumas caixas vazias, de tamanho médio, porém havia algumas janelas.
No primeiro andar, Talia encostou numa parede e gritou mais alto ainda, caindo de joelhos e chorando, a dor estava mais insuportável que nunca. O restante ali dentro era Alayne, Droenn, Rina, Tobin, Melisandre, Serena, Aaron, Skyron, Alfer e os quatro soldados. Droenn, Aaron, Skyron e Alfer soltaram um grito em conjunto ao colocarem toda força para segurarem as duas portas fechadas quando os inimigos começaram pular nelas para abri-las.
Estavam encurralados.
A rainha que estava de joelhos no chão parou de gritar quando a dor diminuiu, mas quando sentiu algo mais pegajoso entre suas pernas, colocou os dedos ali e viu sangue, e sabia que as crianças estavam mais próximas que nunca. E, então, a dor veio com mais força e o grito foi tão alto que sua garganta quase acompanhou a dor do útero.
De repente, os inimigos pararam de se jogar nas portas e foram silenciados por um homem.
— Silêncio, seus malditos! — gritou o homem para seus soldados, sua voz era bem grossa e firme. Quando o silêncio se manteve ali fora, o homem coçou a garganta e continuou, dessa vez para quem estava dentro da torre: — Sei que estão ai dentro. Meu nome é Sowyer Algood, um dos comandantes mais respeitados do exército de Jan. Serei direto e sincero, queremos apenas a garota Targaryen e a grávida. O resto saíra com vida, não importa se lorde ou soldado. Evitemos mais derramamento de sangue inocente, por favor.
De dentro, o grupo ouvia alguns murmúrios dali de fora, mas não conseguiam identificar o que eram. E ao ouvirem aquelas palavras, três dos soldados entreolharam-se, nervosos.
Conforme caminhou para fora do castelo, as pessoas se despediram dele e o saudaram, agradecendo por livrá-los do reinado de Kean, o que lhe fazia muito feliz, devolvia todos gestos, apertava a mão dos homens, esfregava o cabelo das crianças e abraçava as mulheres. Então, estava sozinho no exterior do castelo, no puro silêncio.
Rhaego chegou, avisando que iria com ele, algo que o deixou feliz. Em seguida, veio o rapaz amigo do homem.
— Senhor, não me esquece! — berrou o rapaz vindo correndo. — Eu ainda quero segui-lo — disse Cetim respirando com dificuldade, viera correndo desesperadamente.
— Para isso você precisa de um cavalo, Cetim — salientou Rhaego.
O rapaz olhou em volta e realizou que chegara sem nenhum, deu um sorriso sem jeito e pediu que o esperassem, voltando a correr, desta vez de volta para o castelo em busca de um.
E enquanto ele estava procurando um cavalo, um estandarte claramente improvisado foi pendurado no alto da muralha, pinchado de preto e com o simbolo da casa Targaryen desenhado a mão. Para qualquer lorde ou rei aquilo seria uma afronta, o desenho estava torto e um pouco feio, a pintura do preto não estava cobrindo todo estandarte que tinha as bordas brancas da cor original, mas para Daeron aquele gesto dos moradores, aquela conquista, foi a primeira vez que lhe aqueceu o coração e lhe fez se orgulhar.
Sorriu, tirou os olhos do estandarte que balançava levemente no ar muito atrás dele e começou galopar junto da dupla, em direção à sua família e amigos. E ao chegarem num ponto da estrada que tinham inúmeros trajetos para várias direções, encontraram Arthur lá, que fora até onde enterrara sua espada para tirá-la, decidido que havia chegado a hora de trazer o Arthur verdadeiro de volta e afundar a casca, queria honrar a família que foi morta injustamente ajudando Daeron em seus planos e queria ajudar o filho do homem que jurou servir, agora tão crescido e maduro que sabia que seu pai sentiria vergonha de tê-lo tratado como o tratara, e Aegon sorriria como nunca ao ver como seu irmãozinho crescera.
Rhaego olhou para todas rotas por alguns segundos observando que apenas alguns passos e sua vida poderia tomar um rumo completamente novo, mais tranquilo e sem o sofrimento eterno que era aquela guerra. Mas uma vida tranquila não combinava com Rhaego Velaryon. Nunca combinara. Se todos seus amigos estivessem vivos, estariam lutando neste momento, por suas vidas e pela vitória, não havia um deles que não sofrera como ninguém merecia nessa vida, desde o inicio, e não os abandonaria naquele ponto. Não sabia quanto havia mudado dentro de si, o que havia mudado, mas aquilo não realmente importava, viveu os piores dias de sua vida, fez as piores coisas dela, mas ainda estava vivo, disposto a formar um futuro que aquilo não acontecesse mais. E se Daeron estivesse certo, todos aqueles sacrifícios não teriam sido a toa, trariam bons dias aquelas pessoas e aquele continente.
Então, sem olhar para trás, mas ainda assim com todos objetivos formados pelo que sofreram no passado, os filhos de Aenys Targaryen e Daemon Velaryon cavalgaram em direção ao seus deveres sem medo ou hesitação, orgulhando os dois grandes homens mais do que poderiam imaginar. Mudariam o continente, se conseguissem.