Parece que estou ficando resfriada, pensou e espirrou novamente. Não havia completado um dia desde que chegara no Norte, haviam desembarcado num porto qualquer e no mesmo momento uma rajada de ar a cobriu, revelando o frio assustador daquela região. Criada e até então moradora de Essos, continente conhecido pelos vários desertos e o clima quente, seu corpo adaptava-se lentamente àquele maldito lugar. Espirrou novamente, remexendo-se no cavalo e causando risadas no irmão, xingou-lhe e limpou o nariz com o braço. O grupo cercando-a era pequeno, talvez possuísse trinta homens, o restante do exército fora para Última Lareira sede da casa Umber. Droenn não parecera muito empolgado em começar tão cedo as conversas com os nortenhos e Harrold queria acompanhar o rei na sua pequena viagem, mas Daeron insistira que os dois fossem para lá. Olhou para mulher ao seu lado, o irmão ordenara que ela fosse com ele.
https://www.youtube.com/watch?v=65As1V0vQDM- Vocês dois estão juntos? - questionou baixinho para Talia.
- Não, nem pensar - negou ela, virando os olhos para as costas do homem alguns metros à frente.
- Por que ele obrigou-a vir então?
- É o que descobrirei - sussurrou olhando-o.
Franziu o cenho, agradecia-se pelo desinteresse naquele tipo de coisa, aqueles dois viviam brigando. Escutou alguns gritos de surpresa e logo pôde ver o que era, quando saíram da floresta e entraram num campo, depararam-se com uma grande fortificação de gelo no horizonte, era a
Muralha. Serena esbugalhou os olhos, nunca ouvira falar daquilo e olhando agora era impressionantemente enorme, abriu a boca para dizer algo, mas nada saíra. Era a primeira vez que Daeron e Talia a encontravam também, não estavam tão fascinados quanto a menina ou vários guerreiros do Targaryen, mas não podiam esconder os olhos maravilhados com tamanha beleza. Acertou os calcanhares no cavalo e o fez correr pelo campo, queria vê-la de mais perto o mais rápido possível, não recebeu nenhuma repreenda pois todo restante galopava com o mesmo objetivo.
A muralha se estende por quinhentos quilômetros e tem aproximadamente duzentos metros de altura, pelo que dizem, é feita de gelo sólido e rocha, explicou Daeron enquanto o seguiam para algum lugar. Aproximando-se, notou que parecia uma mistura de azul e cinza, descobriu por algumas vozes que sua cor mudava de acordo com o horário e segundos mitos havia antigos feitiços encrustados no gelo para fortalecer a Muralha e repelir criaturas de natureza mágica como os Outros.
- Outros? - perguntou Serena, não fazia ideia do que eram.
- São criaturas de gelo, apareceram pela primeira vez há milhares de anos durante um inverno que durou toda uma geração, um período de escuridão conhecido como A Longa Noite. Eventualmente, eles foram derrotados, dizem pela Patrulha da Noite, mas Melisandre contou-me que um herói lendário chamado Azor Ahai os derrotou com uma espada de fogo chamada
Luminífera - respondeu Daeron.
- A Longa Noite? Azor Ahai? Luminífera?
- A Longa Noite foi quando os Outros dominaram o continente, a escuridão cobriu o mundo e o herói, Azor Ahai, foi escolhido para lutar contra ela, mas ele precisava de uma espada digna de um herói - tocou na bainha de Blackfyre - Ele trabalhou por trinta dias e trinta noites até forjar sua espada, no entanto, quando ele mergulhou a lâmina na água, a espada se quebrou. Ele não desistiu, então tentou novamente. Na segunda vez, ele levou cinquenta dias e cinquenta noites para fazer uma lâmina ainda melhor que a primeira. Para temperá-la, dessa vez, capturou um leão e enfiou a lâmina no coração da fera, mas o aço quebrou mais uma vez.
- Esse cara era um péssimo forjador - comentou Talia, fazendo Serena rir e até mesmo Daeron.
- Talvez, mas lembre-se que eram épocas antigas, porém mágicas. Na terceira vez, ele tomou uma decisão difícil. Após trabalhar cem dias e cem noites, ele chamou sua esposa, Nissa Nissa, e pediu que ela descobrisse o peito. Ele enfiou a espada no coração da esposa, e a alma e a coragem dela combinaram-se com o aço da espada, criando Luminífera.
- Esse cara é um babaca - sussurrou Serena voltando seus olhos para Muralha.
- Existe uma profecia que diz que os Outros retornariam e Azor Ahai, o Príncipe que foi Prometido, renasceria para conduzir a batalha e salvar o mundo novamente.
- Talvez seja você, afinal, é o rei - brincou ela.
- Não, deve ser alguém que ninguém espera, talvez um filho de fazendeiro. Todas histórias sobre escolhidos começam com alguém desse tipo.
- Porque foram criadas por alguém desse tipo - respondeu Talia.
O assunto acabou quando fortificações e casas de pedra surgiram nos pés da Muralha, o
Castelo Negro mostrou-se tentador apesar da aparência mórbida e melancólica, viram vários pontos de fumaça subindo pelo azulado do gelo e adivinharam que estavam fazendo alguma fogueira. Entraram numa pequena estrada que sumia pouco depois, sentindo o frio do local aprofundando-se em seus casacos de pele, fazendo-os quase inúteis, principalmente para Serena. Um grupo grande de homens vestidos de negro reuniram-se na entrada do lugar com espadas e lanças, avaliando-lhes com um semblante nada agradável, em frente à tantos homens estavam duas figuras bem protegidas do frio, olhando-os com uma expressão semelhante. O da esquerda era ruivo, usava um tapa-olho e parecia não ter uma orelha, enquanto o da direita era um gordinho amedrontado.
- Parem! Quem são vocês? - ordenou saber o
ruivo.
- Meu nome é Daeron, vim aqui para visitar meu irmão! - gritou ele, avisando-os que não queria problemas.
- Senhor, eles são inimigos? São inimigos? - perguntou o
gordo, ansioso e com medo, irritando o homem.
- Colren, se me deixar falar com eles descobriremos - repreendeu-lhe e voltou sua atenção para o grupo. - Meu nome é
Fillip, sou o Primeiro Patrulheiro, o segundo em comando da Patrulha da Noite.
Os dois líderes reuniram-se e apertaram as mãos num gesto de confraternização que acalmou ambos lados. Serena analisou o local, notando alguns prédios destruídos e vários locais com sinais de incêndio, notou o próprio ruivo e seus inúmeros homens cobertos de machucados, olhando claramente viu duas pilhas de corpos perto do elevador que levava para o topo da Muralha, uma cheia de patrulheiros e outra com o dobro de cadáveres, mas esses eram homens vestidos de peles, viu alguns dos homens ausentes da reunião no lado de fora carregando os corpos dos desconhecidos pelo túnel feito dentro do gelo, provavelmente para o outro lado.
O que aconteceu aqui? Seus olhos encontraram-se com um loiro afastando-se da reunião com alguns livros na mão, sumindo numa curva e adentrando em algum local que ela não vira. Voltou sua atenção para o irmão e o belo homem se não fosse as mutilações visíveis, vendo-os discutir sobre alguém chamado Pyke e a situação dali. Fillip explicou-lhes sobre o Rei-Para-Lá-da-Muralha, o inicio da revolta dos selvagens para atravessarem a Muralha e invadirem os Sete Reinos, falou sobre o egoismo de Jan Baratheon em não ajudá-los e como tiveram que lutar sozinhos, citou seu tio Peixe Negro vindo ajudá-los no combate e salvando-os da morte certeira, pareceu triste ao citar que o homem morrera no fim do combate, mas que foram vencedores. Porém os problemas não pararam ali, ainda havia milhares de selvagens espalhados pela região e não ficaram nada quietos em relação à derrota, a comemoração fora curta e os problemas surgiram novamente.
O resto é história, terminou evitando mais detalhes do que acontecera.
- Eu sabia sobre algumas tentativas de invasão de selvagens, mas achava que eram minuciosas, nunca achei que poderiam juntar-se para uma guerra declarada contra vocês. Seu tio realmente foi o único lorde que os ajudou? Isso é estupido, os outros não notam que se esses homens invadirem haverá problemas sérios para suas casas? - questionou Daeron irritado, olhava para situação daquele lugar notando a desgraça que estavam.
- Ninguém considera os selvagens como uma ameaça real.
Esses homens sem cérebro não vão passar de duas milhas sem que sejam exterminados, se eu me preocupasse com qualquer idiota que se nomeasse rei sem ter nada, meus cabelos seria brancos como a neve, respondeu Jan quando fomos à Porto Real por ajuda, gargalhou como nunca enquanto nosso enviado voltou com a cabeça abaixada sem poder fazer nada - Fillip soltava as palavras com ódio, sofrera como muitos dali e aquilo não servira para nada, pois no ritmo que as coisas iam, os lordes continuariam ignorá-los e logo o Castelo Negro cairia. - Levarei você à nosso comandante.
Subiram escadas dirigindo-se à um prédio bem construído mesmo que aparentasse cair como todos os outros, o lugar era velho, mas resistente como os patrulheiros. O grupo foi deixado no pátio do lugar para observar os corvos carregando os corpos dos selvagens para o outro lado da Muralha, ela e Talia foram levadas por Daeron para os aposentos do comandante por serem mulheres, os homens de fora olhavam-nas salivando. O ruivo abriu a porta e deixou que entrassem, encontraram um homenzarrão parado em frente à uma lareira, observando-a pensativo, em sua cintura a bainha guardava uma das maiores espadas vistas por ela, não duvidava dela acertar todos os inimigos numa distância considerável. Virou-se para eles, surpreendendo-se com a aparência de Daeron. Seu nome era
Skjor, apresentaram-se normalmente, iniciando uma série de perguntas e questionamentos sobre ambos lados, o irmão sobre sua família e o gigante sobre sua presença naquele continente, obviamente surpreso pela sobrevivência do rapaz, acreditava que o mesmo havia morrido e as notícias de seu sumiço foram compartilhadas apenas para que os lordes mais honrados não perdessem o respeito pelo rei Baratheon. As duas mulheres apenas puderam observá-los contar histórias um para o outro, da patrulha e de Essos, explicando como havia se tornado comandante e como crescera para tornar-se rei, como haviam sofrido nas mãos dos Lannister e Baratheon, os dois pareciam nutrir uma conexão bizarra.
Skjor contou-lhes sobre Pyke, como chamavam Aegon, e sua vivência na Patrulha da Noite:
- Junto à Duncan, O Salvador, ele era um dos homens mais honrados daqui, um grande amigo meu, foi o primeiro com qual eu pude conversar sobre meu futuro aqui, ele me disse que eu teria várias surpresas pela frente e hoje em dia sou o comandante da Patrulha da Noite, pode-se dizer que foi algo que nunca esperei.
- Era? - a tristeza na voz de Daeron veio de súbito, notando de vez como o homem fugia de contos atuais.
O rosto nostálgico de Skjor mudou para algo mais triste, seus olhos desceram para o chão por alguns segundos até que retomasse a compostura e voltasse à falar:
- Ele morreu por uma lança inimiga durante nossa ida à Floresta Sombria, atrás de respostas sobre o que estava acontecendo - contou Skjor.
Daeron ficou abalado na descoberta, junto com os anos de planejamento para a reconquista de Westeros sempre imaginou o reencontro com o irmão numa visita alegre à Muralha, vendo-a pela primeira vez e com ele sobre ela, observando a paisagem em volta lá de cima, como dois dragões nos céus. Juntou as mãos num punho e encostou sua testa nele, não sentia tanto peso desde a morte de Garren, mal havia começado aquela guerra e perdera tanto. Subiu a cabeça e forçou um sorriso:
- Eu sei que há outro de minha família aqui, está vivo?
O rosto do comandante não mudou da expressão triste, fazendo com que o irmão temesse o pior, mas levantou-se e pediu que o seguissem, depararam-se com um velho deitado numa cama, não movia um músculo e estava sendo cuidado pelo mesmo gordo de fora.
Praticamente um cadáver, reparou Serena olhando-o com pena. Aemon deitava-se estático na cama, olhando para o teto como se estivesse congelado, explicaram que estava doente há semanas, piorava a cada dia e nada havia que pudessem fazer nas várias batalhas que se meteram, a segurança seria deixá-lo ali sob cuidados de Colren sabido em medicina ao invés de tentar tirá-lo de lá e deparar-se com um grupo de selvagens.
Ele não consegue falar nada, explicou Skjor,
mas ainda pode ouvi-los caso queiram dizer algo. Não sabia muito bem como reagir aquelas notícias, eram seus familiares, mas nunca falara com nenhum deles, nunca os vira e até mesmo ouvira sobre eles, eram desconhecidos até o momento, então tudo que pôde fazer foi apertar o ombro de seu irmão ao vê-lo fechar-se de angustia ao saber da morte de seu outro irmão, mas quando viu a situação do velho, algo despertou em seu coração e sentiu uma conexão grande com o pobre idoso, acompanhou Daeron e cada um pegou uma mão do velho, apertando-a com carinho. Aemon pareceu acordar de seu transe, não disse nada, apenas virou-se para Serena e entregou-lhe um sorriso com poucos dentes, a menina aproximou-se e beijou sua testa, enquanto Daeron começava a deixar lágrimas escorrerem pelos olhos. O velho virou-se para o homem de cabelos brancos e deixou que lágrimas caíssem também, abrindo um sorriso maior. Foi ali que um dos homens mais sábios dos Sete Reinos morreu, foi ali que a vigia de Aemon Targaryen terminou.
Talia[Babi]Vestimenta: Camadas de pele para aquecer seu corpo.
Armas: Duas espadas curtas e uma adaga com um chifre gravado na lamina.
Começava anoitecer quando encontrou o Targaryen no topo da Muralha, perto da beirada, olhando a paisagem no outro lado com os olhos vazios, estava tão triste quanto nos dias de sofrimento que passara ao lado de Serena ferida e depois da morte de seus companheiros. Os cabelos brancos sumiam naquela vastidão branca. Pretendia chamá-lo, mas antes mesmo de colocar-se ao seu lado para observar também o mesmo começou a falar:
- Depois de anos, vim para cá pensando encontrá-los vivos e prontos para horas de conversa, em minha mente eles me incentivariam a dominar o continente e até me contariam histórias de suas conquistas antigas, pelo menos as que apenas eles conheciam - seu tom de voz estava calmo, mas extremamente triste. - Parece que essa guerra será muito pior do que esperei, não foi um belo começo hoje. Ponta de Tempestade é um dos locais mais difíceis de capturar, um cerco é perda de tempo naquele local, único jeito de adentrá-lo é convencer quem estiver dentro de desistir e abrir os portões. Você nasceu lá, deve conhecê-lo bem, preciso que me conte como invadir aquele local.
Droenn[Prime]Vestimenta: Camadas de pele para aquecer seu corpo.
Armas: Espada com a cabeça de um lobo gigante esculpida em seu punho, nomeada de Netuno. No guarda-mão, as dizeres de sua casa grafados: O inverno está chegando.
Orumon Umber era um homem esguio e estranho, tratava-o como se fosse rei, tão gentil que parecia disperso naquele continente de miséria prestes a explodir numa guerra.
Acho que nem mesmo Daeron deve ser tão bem tratado assim, pensou. Sentiu-se nostálgico galopando naquele bosque, nunca havia visitado o lugar, mas era igual às florestas de Winterfell, respirou fundo e pôde aproveitar aquela sensação agradável de sua infância, as árvores com copas vermelhas misturavam-se com o solo coberto de neve e deixavam o lugar com uma beleza extraordinária, o Rio Último corria ao lado da floresta, servindo como uma das muralhas de Última Lareira, a sede da casa Umber. Entrou no lugar, saltou do cavalo e deixou que Orumon o levasse para o lorde, teve que subir milhares de degraus numa
escada interminável, até que finalmente pôde adentrar no lugar e deparar-se com um grande salão vazio, apenas uma figura a ocupava.
Mors "Papa-corvos" Umber sentava-se num pequeno trono de pedra, encarando-lhe enquanto aproximava-se. Ajoelhou em frente à ele e o homem franziu o cenho.
- Você é o futuro protetor do norte, o Stark que os homens prometeram me trazer, não é? Não ajoelhe-se, garoto, tente não começar mal seu domínio do norte - o velho parou para analisá-lo. - Você realmente é muito semelhante a seu pai. Espero que não me leve à morte como ele levou meu sobrinho e seu filho. Surpreso? Sim, não sou Grande Jon ou Pequeno Jon, meu nome é Mors e sou o castelão, ambos foram mortos no Casamento Vermelho e os Frey mandaram-me numa bandeja suas cabeças, dizendo que o rei prometera fazer o mesmo com qualquer outro rebelde. Jan Baratheon é muitas coisas, mas um tolo não é, não faria esse tipo de coisa com qualquer um, então pode-se dizer que aquela casa de incesto está condenada na maldita arrogância. Mas além de vingança eu tenho outros motivos para apoiar a retomada do norte. Além de méritos próprios, por que planeja retomá-lo? Que tipo de lorde pretende ser?